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Minha vida na Legião Estrangeira: Part2 : Centro de Seleção Aubagne

  • CAMERONE http://cameronebrasil.blogspot.com.br/
  • 6 de dez. de 2015
  • 15 min de leitura

Era um dia frio e nublado, o céu estava cinza, o orvalho ainda quase congelado estava na grama, dando uma linda camada branca nos jardins, a estação estava ainda vazia, quando descemos do trem na cidade de Aubagne, fizemos uma fila e bolsa por bolsa descarregamos nossas bagagens do trem, fazendo como uma fila indiana, passava-se de mão em mãos as bolsas. Cada um pegou sua mochila e começamos a caminhas em direção da porta de saída.

Quando saímos da estação ferroviária, um caminhão camuflado de verde militar estava com a porta traseira aberta nos esperando, e então mandaram colocar nossas bolsas lá dentro e subir na carroceria. Saímos em direção desconhecida, e começamos a nos dirigir para fora da cidade, até que chegamos na entrada de uma Rodovia com uma grande placa escrito Marseille, eu deduzi imediatamente que era a cidade do time do Olimpic de Marseille, onde jogava o Mozer. A cidade de Aubagne é uma pequena cidade a uns 20 quilômetros de Marselha, pequena porem muito limpa, muito bonita, com prédios antigos, construções novas dando um certo charme, uma certa harmonia na paisagem de uma cidade. Naquele momento o Marcelo e eu dávamos sorrisos amarelados um para o outro, e eu pensava comigo :

- Meu Deus onde será que vamos?

Quando o caminhão reduziu a velocidade logo depois de percorrer uns 3 ou 4 quilômetros, entramos no portal do 1er Regiment Etranger, uma entrada linda, com um muro bege, escrito em auto relevo com letras douradas : “LEGION ETRANGERE”. Do lado, o lado direito do portão, um grande estacionamento, uma guarita com um soldado muito firme, uma roupa muito linda, igual a que eu tinha visto na revista, e um Kepi Branco na cabeça, com uma arma transversal no peito, uma baioneta na ponta, atrás desta guarita, mais no alto, um posto de segurança, com um suboficial com varias medalhas no peito, e um kepi preto, mas a farda era igual a do legionário, apenas as divisas eram diferentes, mas a postura de soldados sólidos eram as mesmas.

O caminhão entrou em uma bifurcação a esquerda e começou uma leve subida, pude observar uma grande praça com flores e no fundo um monumento quadrado com uma bola preta enorme no cume, e no fundo um grande mural com a descrição : LEGIO PATRIA NOSTRA, mais tarde eu vim a saber que aquele era o monumento a os mortos, que fora trazido de Sid Bel Abes, a cidade da Argélia que era a antiga central da Legião Estrangeira, e logo entramos em um portão estreito, com um pequeno jardim, e então parou. Descemos do caminhão e pegamos nossas bagagens e entramos no subsolo de um prédio, tratava-se do C.S.I. (Centro de Seleção e Incorporação) da Legião Estrangeira.

O Caporal-chef português da silva nos olhou e disse agora vocês irão começar a sua fase de seleção, espero que tenham sorte, vocês estão nas responsabilidades deles agora, tchau.

Então um outro Caporal-chef gordo careca e cheio de tatuagens já nos pediu para tirar tudo que estava na bagagem, tirar nossas roupas e ficar apenas de cuecas, e ficamos sentados nos bancos que estávamos, ele começou a chamar um por um dos que estavam no local, quando chegamos já tinha mais uns vinte outros candidatos, já sem roupas e sentados, com seus pertences todos dobrados, e então ao chamar pelos nomes o Caporal-chef relacionava os pertences e colocavam dentro de um saco V.O. e recebiam cuecas, meias, camisetas, e tênis para quem não tinha, a pessoa experimentava e se estivesse curto ou apertado ele já trocava na hora e então chamava outro e assim seguia. Logo depois nos colocaram em fila e nos levou para cima no primeiro piso, e então subimos uma escada e saímos numa sala de recepção com um grande aquário, sem cadeiras, sem mesas, e apenas uma planta verde no canto da sala, e seguimos subindo ao primeiro andar do prédio, e então nos coloca nos quartos e preenchíamos as camas vagas, que eram de dez beliches em media por quarto. Uma vez colocados a pequena mochila que nos fora dada com nossas mini bagagens de higiene e roupas, tínhamos que esperar no corredor até ele acabar de colocar os outros nos seus aposentos. O Marcelo foi para um quarto separado do meu, e depois de uns 5 minutos ele voltou com os outros o seguindo, descemos novamente para o subsolo, e então nos deu algumas bases dos regulamentos do centro, mas na realidade eu compreendi o que ele falou naquele dia, somente uns 8 anos depois, quando fui trabalhar naquele lugar, mas já como Caporal-chef.

Nos mostrou a direção dos fundos do centro então saímos um atrás dos outros, e ainda bem que tinha um francês que liderava a fila, pois eu mesmo não tinha entendido nada.

O pátio do centro de seleção estava cheio, em media mais uns cem candidatos estavam lá, apenas sentados conversando uns com os outros, e via-se alguns que falavam as mesmas línguas, e outros que falavam com gestos ou em inglês, enfim, víamos que eles conseguiam se comunicar.

De repente ouço um apito e vejo todos saírem correndo como um estouro de boiada, como eu não sabia porque, resolvemos sair correndo atrás dos outros também, e acabamos saindo numa área na frente do centro que era mais ou menos duas quadras de futebol de salão, e todos se alinharam e claro nós seguimos o que todos faziam, olhando para frente, vários legionários estava em cima da escada que dava para aquela sala que tinha o aquário, e então desceu um Caporal com uma lista na mão, e começou a chamar por nomes, e a medida que ele chamava a pessoa respondia :

- present Caporal (prezon Caporal, esta era a pronuncia).

Depois de chamar umas vinte pessoas, ele saiu com elas atrás dele. Em seguida mais um Caporal desceu com outra lista, fez outra chamada e o ritual foi o mesmo, depois de chamar uns vinte nomes, eles o seguiram, e as filas foram ficando ralas, até que desceu um Caporal-chef com um dente de ouro e com ar sorridente e disse :

- Maintenant lá liste des mecs qui à gagné um billet gratuit pour lê Tahiti.

Neste momento eu disse bem baixinho para o Marcelo, que será que ele ta falando? Neste momento um cara do nosso lado disse em português:

- ele disse que vai chamar agora aqueles que ganharam um bilhete gratuito para o Tahiti, quer dizer que estes já vão embora, reprovaram nos testes. Apesar de saber que o Tahiti era um arquipélago da Polinésia Francesa, e que era paradisíaco, a partir deste momento, a única coisa que eu não queria mais ouvir era meu nome nesta lista de ganhadores de bilhetes para o Tahiti. Para estes infelizes o sonho Legião Estrangeira tinha acabado por ali.

Quando saímos de forma, todos voltaram para trás do prédio então começamos a falar com este português, seu nome era Mario, um tipo bem pitoresco e não poderia negar suas raízes, com um português bem reconhecido ele perguntou se era português também, e eu disse que era Brasileiro, ele me perguntou se eu estava morando em Portugal, pois meu sotaque era bem português, realmente tenho que confessar que estava mesmo com um sotaque bem forte, pois sou uma pessoa muito fácil de pegar sotaques, e expliquei que estava a bastante tempo em Portugal e fizemos nossa primeira amizade no centro. O Mario era do tipo trombadinha em Portugal, tinha um jeito bem como dizemos em Portugal, aldrabão, ou seja, malandro, era um tipo de barba cheia, estatura mediana, e muito falador, e o mais importante para nós, ele falava francês, o que poderia nos ajudar bem no momento. Começamos a pedir a ele que nos explicasse o que era a legião na realidade e então ele começou a falar coisas que não estava em nossos planos :

- Vocês não sabem o que é a legião gajo? Perguntou com ar de admirado.

- Cara a única coisa que sabemos é que nem no consulado não sabiam explicar o que era. Respondo com ar de desinformado total.

- Gajo aqui é o seguinte : estás vendo estes gajos lá ao fundo? São todos poloneses, eles estavam morrendo de fome no país deles e estão aqui para tentar se safar da fome, aqueles outros lá são argelinos, uma antiga colônia francesa, e aqueles lá...... e continuou falando de cada um.

- Mas Mario o que tem de especial aqui? Perguntei para saber o que era a legião e não as pessoas que estavam lá querendo se engajar.

- Olha bem, grande parte dos gajos que aqui estão são de assassinos, ladrões, chifrudos, desiludidos, etc... cada um tem sua historia, mas com certeza nenhum tem seu nome verdadeiro, eu por exemplo não me chamo Mario, e ninguém vai saber meu verdadeiro nome, percebes?

- Hummm... entendo... na realidade eu não entendi o porque, mas se ele falou, eu tinha que aceitar afinal ele estava bem mais informado que eu.

Com o passar do tempo, a gente começa conhecer as pessoas que lá estão, mesmo não falando a língua deles, a gente consegue se comunicar, um pouco em gestos, um pouco em francês, em inglês, e assim vai.

A todos os momentos ouvíamos um apito e saímos correndo novamente pra frente do prédio e alinhavamos, era um ritual que se repetia sempre varias vezes por dia, e a cada momento eu morria de medo de ganhar uma passagem para o Tahiti.

Eram onze horas e trinta minutos quando apitaram novamente e saímos correndo, e neste momento muitos dos que tinham saído em fila com os Caporais pela manhã já estavam de volta ao centro, e então todos juntos saímos com fila indiana para fora dos portões do centro de seleção, caminhamos um pequeno caminho e chegamos em frente a uma sala que tinha por nome : Ordinnaire. Quando entramos vi que estava no refeitório, e então ainda na mesma fila pegávamos uma bandeja e uma pessoa do outro lado do balcão servia a refeição, sentávamos e comíamos, e então tive meu primeiro contatos com legionários fardados de verde, e suas boinas verdes, somente meu coração sabia a vontade de colocar logo aquela boina na cabeça. Depois de uns 30 minutos ouvimos o Caporal que tinha nos trazido ao refeitório dizer :

- Début (debu), e todos se levantaram e saíram para fora, formando quatro fileiras, e como todos estavam assim eu também me coloquei na fileira. Voltamos ao centro e quando chegamos no pátio ele disse :

- Allez (alê), e todos saíram correndo para traz do prédio novamente.

Acho que não existe coisa pior que ouvir alguém falar uma língua e você não compreender, quando eu estava atrás do prédio, eu via as pessoas se falando em línguas nunca ouvidas por mim, eu estava acostumado a ouvir falar o inglês, o espanhol, mas aquelas línguas eram muito estranhas, era difícil identificar, e eu me sentia realmente muito agoniado com aquilo, porque eu como sempre fui comunicativo, queria falar, conversar, conhecer as pessoas, e saber o que elas estavam pensando daquilo, quais seus objetivos, os porquês de estarem ali, e então prometi a mim mesmo :

- quando eu sair daqui quero estar falando todas estas línguas.

Depois de uma hora de descanso atrás do prédio, lá vem o apito novamente, saímos correndo, e estávamos em forma no memso lugr, quando vi todos aqueles legionários de novo em cima na entrada do prédio, e cada um com uma lista na mão. Eu aceitaria fazer qualquer coisa para continuar ali, mas nem podia imaginar e nem queria imaginar ganhar uma passagem para o Tahiti, e então começou o mesmo ritual de cedo, com a lista na mão o Caporal chamava e a pessoa respondia, sai de forma e começava uma nova fila, e assim foi até o ultimo Caporal chamar sua turma e sair. Então ouvi o Mario falar atrás de mim :

- Lá vem a morte. Falou baixinho.

- Quem ? perguntei confuso.

- O gajo que chama os caras que vão para o Tahiti. Que queria dizer claro, que ia embora, tinha reprovado em algo.

Ai meu coração disparava, e sentia um calor enorme que subia do pé a cabeça. E mais uma chamado do mesmo Caporal-chef que tinha o dente de ouro, quando ele dava um sorriso e dizia com sua lista na mão :

- Maintenant lês mecs que e gagné um billet gratuit pour aller passer de vacances au Tahiti.

Notava-se a inquietude de varias pessoas, ninguém queria ser dispensado, e de vez em quando a gente ouvia chamar um nome e a pessoa dizer baixinho para o amigo do lado:

- *Curva sceno. Era mais um polonês que estava indo embora. Quando ele acabava a lista era um alivio geral para quem continuava em forma.

· CURVA SCENO = em polonês quer dizer filho da puta.

A primeira noite no centro foi algo bem incomum para mim, quando nos recolhemos para os quartos, eu estava num terreno completamente estranho, e estava com minhas coisas na parte superior da beliche, e embaixo de mim estava um cara de quase dois metros de altura, olhos azuis, cabelos finos loiros e um baita de um tórax, muito forte mesmo, e então cumprimentei ele, e ele disse algo que não entendi, então como fazia o Tarzan para as pessoas nos filmes ele colocou a mão no peito e disse :

- Romênia.... MRAZEC .....batendo no peito.

- Eu como já tinha visto o filme, bati a mão no peito e disse : - BRASIL.... PADELA....e dei um sorriso.... achei a cena muito interessante e engraçada.

- Ele imediatamente respondeu com um sorriso – AH ! Bresil? Naldo, Mozer, Zico, Pelé, escrava Isaura, samba, futebol...e sorriu amigavelmente..

Bom, eu pensei, ótimo, pelo menos o gigante ai já é meu fã. É engraçada a facilidade do ser humano de se comunicar, onde quer que você esteja, sabendo ou não falar a língua, sempre existe uma forma de se comunicar com as pessoas. Ao decorrer desta minha aventura você verá que não é necessário ter um conhecimento profundo de línguas para entrar em contato com outras pessoas, na realidade o que temos que fazer é simplesmente não ser tímido, não ter medo de errar, se aventurar, e sobre tudo ousar, porque a pessoa que não ousa em sua vida como disse o grande escritor chileno, Pablo Neruda : “Morre lentamente”. O melhor caminho para uma inicial comunicação é o sorriso, ele abre portas.

Eram cinco e meia da manhã quando o bendito apito se ouviu no hall de entrada, foi um apito tão forte que não tinha como não dar um pulo da cama, e então começou a correria para o toalete da manhã, em quinze minutos, todos estavam em forma novamente no pátio do centro. Ainda era noite, estava frio e a gente estava apenas com um conjunto de esporte, sem blusa e num sereno intenso ainda, tremendo de frio, vimos o Caporal no alto da escada e saiu encabeçando a fila em direção do refeitório novamente.

Já passava das oito horas da manhã quando o apito tocou alto e saímos correndo novamente para o pátio, a mesma cena se repetia todos os dias : os Caporais em cima da escada com uma lista na mão, o Caporal-chef com sua lista da morte e um dente de ouro sempre a amostra por causa de seu sorriso, e então era um ritual costumeiro, e a única coisa que não poderia acontecer era ganhar uma passagem gratuita para o Tahiti.

Naquele dia, quando o primeiro Caporal com sua lista chamou, ouvi em um som bem alto e Claro : - PADELÁAA....a resposta foi no ato :

- Present Caporal. Sai de forma e corri para uma pequena fila que já estava sendo formada por outros chamados antes de mim. Uma coisa eu já estava certo: - Não tinha ganho a passagem ainda. Fomos para o teste psicotécnico. Sentamos nas cadeiras, e ele explicou em francês, mostrando num quadro o que devíamos fazer, não entendi nada do que ele falou, mas já dava pra ter uma ideia de como responder um questionário que já estava na mesa, apesar de estar virado de costas sobre a mesa, dava-se pra ver vários desenhos na folha, mas não conseguia distinguir o que era, mas aparentemente era parecido ao que ele tinha explicado no quadro. Então ele explicou que tínhamos quinze minutos para fazer o teste, e mandou virar a folha e começar.

Vi que era um teste de Q.I. como eu já tinha feito na escola antes, estava em português, e então comecei a entender o que teria que fazer realmente, e comecei a responder as questões sem medo pois para mim era apenas um teste, estava tranquilo, mas uma coisa eu não sabia : - que se não atingíssemos uma certa pontuação estava reprovado.

Hoje em dia estes testes são feitos em computadores, e a informática mundial facilitou muito a preparação para os candidatos que tem o desejo de se engajar, pois eles podem se preparar muito tempo antes de ir para a seleção, mas em compensação o medo é ainda maior, pois como estão sempre se informando de como é o recrutamento as pessoas interessadas sabem que os grandes obstáculos são os testes físicos e psicotécnicos, mesmo assim com informações sempre atualizadas estas pessoas ainda conseguem ir para a França e reprovarem nos testes, eu não entendo como tendo tudo na mão para serem bem sucedidos não conseguem passar, em meu site eu dou até mesmo um link onde possam treinar os testes, e são praticamente idênticos os testes aplicados na legião, mas a maioria das pessoas não se importam com isso, e acabam fazendo uma viagem e tendo gastos enormes para não atingirem seus objetivos, no fórum de meu site eu coloquei um tópico chamado “determinação”, e falo sobre isso, pois se querem mesmo ter um futuro na legião, hoje é fácil se preparar, alem do link tenho um gabarito do teste físico que é aplicado na legião, então se houvesse real interesse e determinação para serem aprovados estas pessoas deveriam se preparar e não chegar lá como eu mesmo cheguei, sem saber nem mesmo que poderia ser reprovado e ter que voltar para casa completamente desanimados, eu realmente não estava preparado a passar por isso, visto que o único dinheiro que eu tinha levado era para comer alguns sanduíches e certamente não teria como voltar a Portugal.

Quando acabamos os testes fomos liberados e voltamos para o pátio, e então falei sobre os testes para o Marcelo, que ainda não tinha passado por eles.

Depois deste dia do teste parece que eles tinham descoberto meu nome afinal, pois não paravam os testes e as limpezas no quartel, quando não estava fazendo os testes, exames médicos ou entrevistas na famosa Guestapo, que é o D.R.L.E. (departamento de Recrutamento da Legião estrangeira), eu estava fazendo limpezas no quartel, e assim passamos a primeira semana, eu já tinha feito varias amizades no centro, conseguia já me comunicar com todo tipo de pessoas e de todas as nacionalidades. As limpezas eram muito bem vindas, pois a gente não ficava lá atrás no pátio pensando no que estaria acontecendo no mundo lá fora, não tínhamos tempo para pensar se valeria a pena estar ali ou não, naquela época eu comecei a entender a famosa frase usada na igreja adventista :

- Mente desocupada é oficina de satanás.

Alem de estar fora do centro trabalhando, a gente acabava sempre conhecendo pessoas, e vendo como trabalhavam os legionários, mas dava para ter uma noção também de como eles eram brutos e grossos, nunca pediam nada, apenas dava ordens, e claro deveríamos cumprir ao pé da letra, senão corríamos o risco de chegar no centro a tarde e ter uma reclamação de nosso trabalho e isso seria eliminação imediata da seleção. Neste tempo conheci um brasileiro que era motorista da ambulância no quartel, um mineiro de pequena estatura, um pouco já com a idade acima dos trinta e cinco ou quarenta anos, uma pessoa simpática que sempre dizia para não envergonhar nossa raça na legião, tratava-se do Caporal-chef Ribeiro, somente alguns anos mais tarde encontrei ele novamente já no 3éme REI, quando ele fazia parte da Policia Militar da Legião, que seria equivalente a Policia do Exército aqui no Brasil, foi ai então que soube quem ele era realmente, pois não tinha a mínima ideia de que aquele pequeno homem aparentemente já avançado na idade, era faixa preta de karatê, e uma pessoa super respeitada na Legião, apesar de sua idade, conseguia lutar e derrotar três ou quatro pessoas sem grandes dificuldades, e sem falar que fazia o melhor arroz da França.

O teste físico naquela época era de correr doze minutos sem parar e tentar correr a maior distancia possível. Hoje este teste foi substituído pelo Luc Leger, um teste que se aplica a uma distancia de vinte metros, fazendo idas e voltas, com fases a ser alcançadas, chamadas palliets. O restante do recrutamento não mudou muito, você poderá ver estas etapas nas ultimas partes deste livro.

Quando não estávamos em testes ou fazendo limpezas no quartel, estávamos atrás do centro, discutindo e conversando com outras pessoas, foi ai que conheci um rapaz Turco chamado Kartal, um rapaz alto, magro, olhos verdes, muito robusto fisicamente, e conversando, chegamos a uma altura que perguntei ;

-Kartal, porque você veio para a Legião Estrangeira?

- Eu tive um problema na Turquia – conversando em inglês e em gestos-, eu fiz sexo com uma menor de idade, e se eu voltar na Turquia, corro o risco de ser enforcado.

Fiquei meio confuso, porque não sabia muito bem o que responder e nem o que dizer. Na legião, a gente se depara sempre com pessoas problemáticas na vida civil, como era o caso do grandalhão do meu quarto, o romeno Mrazec, ele estava lá porque ele e seu irmão assaltaram uma delegacia de policia para roubar armas para assaltar bancos, seu irmão estava preso, e ele não teve outra saída senão a legião, a medida em que o tempo se passava eu via que realmente as palavras do Mario tinha um certo sentido, apesar de serem, um pouco exagerada, mas fui aprendendo que algumas perguntas não se fazem a legionários, e uma delas é : Porque você esta na Legião?

Duas semanas mais tarde o Marcelo passou a Rouge (vermelho), o que dizia que ele tinha sido aceito na legião, e eu ainda não tinha nenhum resultado, e então combinamos que se eu reprovasse ou não fosse aceito, ele também pediria para sair, mas na sexta feira em que ele ia partir para a instrução em Castelnaudary, eu recebi o rouge também, mas então tivemos que conviver na ideia de que iríamos nos separar ali, mas marcamos e deixamos bem claro que pediríamos para ir para a cavalaria depois da instrução, o nosso regimento seria o 1er REC (Regimento Estrangeiro de Cavalaria), e então ele partiu, eu agora estava sozinho, mas já estava seguro de que na próxima semana eu também iria partir para a instrução.

Quando passávamos a rouge, éramos separados do restante dos grupos, e não fazíamos mais limpezas no regimento, a semana de rouge, é dedicada a recepção de materiais, medidas de roupas e Képi, assinatura de contrato, preparação de documentos e outras preparação para a instrução.

Sexta feira quatro horas da manhã nos levantamos e limpamos nosso quarto e retiramos todas as nossas bagagens, colocamos no pátrio e então colocamos roupas de combate novinhas, e uma bela boina verde na cabeça, eu já me sentia um verdadeiro militar, e então a oito hora da manhã fomos entregue as ordens de um sargento do 4éme RE ( Regimento Estrangeiro), o regimento escola da Legião Estrangeira. Embarcamos todas as bagagens e então partimos em direção a instrução.


 
 
 

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